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E APOIS! – FUTEBOL: CULTURA DA VIOLÊNCIA?

OS “ELES” QUEREM NOS FAZER CRER que   a violência nos estádios de Futebol é resultante apenas da índole criminosa das torcidas organizadas. E não também, e principalmente, decorrente da forma incivilizada e insidiosa com que a Grande Mídia, televisiva ou escrita, induz rivalidades fundamentalistas, calcadas no menosprezo entre os adversários, como se uma simples partida de futebol representasse oportunidade inadiável para se travar uma guerra campal entre inimigos mortais. E deliberadamente, ao visar somente o lucro fácil, “Os Eles” transformam a prática de um esporte que deveria ser benfazeja numa espécie de arma violenta simbólica, cujo propósito é sempre derrotar e subjugar o oponente, ao invés de propagá-lo como momento propício à amistosidade e à confraternização.

É o que acontece com times expressivos, a exemplo de Flamengo e Corinthians, exageradamente ovacionados pela mídia capitalista, como forma de menosprezar as torcidas menores e, desse modo, sufocar as pretensões dos times medianos, ou com a nossa “Seleção Canarinho”, habilmente manipulada para servir de instrumento à manutenção do alheamento político, afastando, assim, do foco da discussão as medidas realmente necessárias para equalização das desigualdades socioeconômicas que ceifam as esperanças de nosso povo já no nascedouro.  E isto é mais perceptível, ainda, na periferia do país, onde os times locais, e isso é bem típico no Nordeste, são alvos de uma ojeriza inexplicável.

Diante disso, ouvir de uma pessoa leiga: “Se vivemos numa sociedade onde é preponderante o interesse privado de meia dúzia de Cartolas aliados a uma Mídia descompromissada com o desenvolvimento real do Brasil, cabendo a estes ditar as modalidades esportivas que devem prevalecer na educação de nosso povo, então não é de educação esportiva que versam as políticas públicas e, sim, de um oportunismo escuso, maniqueísta”. Os Desportistas e outras pessoas letradas a serviço dos “Eles” dirão que o Futebol está para o brasileiro, assim como a Guerra estava para os fundamentalistas da velha Europa.

E quanto ao simples torcedor, alijado sempre da escolha sobre que time verdadeiramente lhe encanta, porque os propagandistas “Dos Eles” desde cedo lhe incute a predileção por este ou aquele time mais lucrativo e, por isso, vitorioso, entenderá ele, algum dia, que as questões de gosto, assim como a Política e a Religião, são sim discutíveis? E que, quando se fala em direito de livre escolha, quer-se, porém, ao mesmo tempo reafirmar o velho maniqueísmo que fraciona o mundo entre o Bem e o Mal, de forma que não há piedade para quem escolhe mal?

É, por essas e outras, que “Os Eles” volta e meia sacam um “Ás” da manga, numa cartada que emudece os opositores e estupidifica o dito cidadão comum. Fazendo-o crer que jogadores forjados pela Mídia gananciosa e o oportunismo empresarial são uma espécie de redentores do nosso infortúnio social, pois nos engrandece, ao elevar aos píncaros futebolísticos, garotos oriundos da privação e do abandono, exceções tidas como protótipos invejáveis, negociados a peso de ouro – e de sangue – para alegria e festa da nossa mil vezes Salve! Salve! “Pátria de Chuteiras”, abençoada por Deus e pelos “Os Eles”.

Então, como dizem os amantes do RUGBY, “esporte de selvagem jogado por cavalheiros”: O Futebol, pela voracidade inescrupulosa de Cartolas e da Mídia Fascista, ávidos apenas em acumular cifras, tem se transformado de fato num “esporte de cavalheiro jogado por selvagens”, pelas atitudes daqueles que, parodiando o grande Machado de Assis, partilham da mesma opinião que a bola, ou faz uso como régua e compasso de um bastão com pregos na extremidade.

Por: Adão Lima de Souza 

Uma mulher é assassinada a cada duas horas no Brasil; estupros aumentaram 3,5% em 2016

ato-feminicidioUma mulher foi assassinada a cada duas horas em 2016 no Brasil, segundo levantamento feito pelo Anuário Brasileiro de Segurança Pública divulgado nesta segunda-feira (30). No ano passado, o Brasil atingiu o recorde de assassinatos: 61.619.

Em números absolutos, 4.657 mulheres perderam a vida no país. Apesar disso, apenas 533 casos foram classificados como feminicídios mesmo após lei de 2015 obrigar registrar mortes de mulheres dentro de suas casas, com violência doméstica e por motivação de gênero.

“Temos que ter uma rede ampla de atendimento para a mulher. Esse é um dos motivos para a subnotificação tão grande de feminicídios. O crime é o desfecho fatal de uma série de violências”, diz Olaya Hanashiro, consultora-sênior do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Para a diretora-executiva da entidade, Samira Bueno, a presença de mulheres nas polícias é muito baixa, o que também prejudica o número de registros. “Não faz sentido ter uma corporação com 90% de homens e 10% de mulheres”, diz.

O presidente da Associação Nacional dos Praças (Anaspra) e integrante do Fórum, Elisandro Lotin, completa dizendo que as poucas policiais ainda sofrem assédio sexual e moral nas instituições.

O Mato Grosso do Sul é o estado com maior taxa de mortes de mulheres do país: 7,6 por 100 mil habitantes – 102 mulheres foram assassinadas no estado no ano passado, aumento de 22,9% se comparado ao ano anterior.

O Pará é o segundo estado com maior morte de mulheres proporcionalmente, com taxa de 6,8 por 100 mil habitantes, seguido pelo Amapá.

Estupros

O número de estupros cresceu 3,5% no país e chegou a 49.497 ocorrências em 2016. A taxa por 100 mil habitantes é de 24.

Mato Grosso do Sul também é o estado com maior taxa de estupros: 54,4 por 100 mil habitantes, com 1.458 crimes. Na sequência, estão Amapá, com taxa de 49,2 estupros e Mato Grosso, com 48,8.

De acordo com Daniel Cerqueira, diretor de Estudos e Políticas do Estado, das Instituições e da Democracia do Ipea e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a estimativa de órgãos de saúde é de que cerca de 500 mil mulheres são estupradas no país por ano.

“São casos que não chegam à delegacia. Quando vemos a baráarie desses números é porque boa parte do que acontece ninguém vê. Violência doméstica e estupro são tabu no Brasil.

“É uma grande tragédia porque a sociedade é vitimada. A linguagem da violência se dissemina da casa para rua. Pensar em políticas que se fala no gênero nas escolas é fundamental. Ainda estamos na ideia de que só colocar polícia na rua resolve as coisas”, completa.

No total, há 443 delegacias especializadas de atendimento à mulher. A taxa é de 0,4 delegacias por 100 mil mulheres. O Tocantins, com 13 delegacias, é o estado com melhor média de delegacias para cada mulher: 1,7 por 100 mil mulheres.

Lei Maria da Penha

Um projeto de lei aprovado no Congresso aprovado no último dia 10 altera a Lei Maria da Penha. A secretária de Direitos Humanos da Presidência da República, Flávia Piovesan, afirmou ao G1 que vai recomendar ao presidente Michel Temer o veto. O parecer pelo veto atende a pedidos de entidades de direitos humanos e ligadas ao Judiciário.

Se sancionada por Temer, a mudança vai permitir que delegados concedam medidas protetivas de urgência a vítimas de violência doméstica. Atualmente, apenas os juízes podem determinar o afastamento do agressor do lar ou do local de convivência com a vítima. Segundo entidades, a mudança tornaria a lei inconstitucional.

Em entrevista concedida ao G1, Flávia Piovesan afirma que a mudança representa um “retrocesso aos direitos das mulheres”. Segundo a secretária, o papel de concessão “cabe ao [Poder] Judiciário”, e a Polícia Civil “não tem estrutura adequada para assumir essa tarefa”.

Fonte: Portal G1

“Violência se resolve com instituições fortes, não armando a população”

IVANCom o Estatuto do Desarmamento na mira da bancada da bala, entidades da sociedade civil se mobilizam para evitar o que chamam de “retrocesso”.

O Instituto Sou da Paz, uma das entidades que militou pela aprovação do Estatuto em 2003, critica a superficialidade do debate acerca da segurança pública no país, e afirma que armar a população para combater a violência “fragiliza ainda mais o Estado e a Polícia”.

Veja a entrevista do EL País com Ivan Marques, coordenador do Instituto Sou da Paz.

Pergunta. O debate sobre controle de armas no Brasil é fundamentado em dados?

Resposta. Existe muita passionalidade nesse debate. Nessa questão do armamento civil é preciso que as políticas públicas sejam examinadas com muito mais racionalidade. Todas as pesquisas e relatórios sérios, de órgãos nacionais e internacionais, afirmam que não é a arma a solução, e sim o fortalecimento das instituições do Estado, como as polícias e a secretarias de Segurança Pública.

P. O projeto de lei 3722/2012, do deputado Rogério Peninha Mendonça (PMDB-SC), que acaba com o Estatuto do Desarmamento, é justificado com informações erradas…

R. Infelizmente isso é comum no Congresso. A justificativa do projeto do Peninha, na direção de ampliar o porte de armas, já foi rebatida pelo próprio autor do estudo Mapa da Violência, que ele cita. Se fosse um projeto jurídico poderia ser invalidado. Mas por ser um projeto político, mesmo com vícios de origem, não pode ser embargado. Vai seguir seu curso…

P. Qual o interesse da comissão que discute o fim do Estatuto, uma vez que ela está nas mãos da bancada da bala?

R. Nós vemos nossos recursos públicos, dinheiro dos nossos tributos, sendo usados para uma discussão entre armar e não armar a população, mas ninguém usa essa energia parta discutir questões relevantes da segurança pública, como a reforma das polícias, o melhor aparelhamento da corporação, e o baixo índice de esclarecimento de crimes. O que combate o crime é a certeza de que o criminoso será pego, e a impunidade é enorme aqui. Apenas 8% dos homicídios são esclarecidos. Para roubos idem. A comissão não está interessada verdadeiramente nestas discussões. Há um interesse em discutir a liberação de armas. E só.

P. Existe algum perigo na ideia de que a população armada pode resolver a questão da violência e do crime?

R. Os projetos que querem acabar com o Estatuto do Desarmamento acabam sendo justificados por um fator principal: a fragilidade das políticas públicas de segurança. A tese defendida é a de que o cidadão precisa estar armado porque o Estado não garante a segurança. Achar que o a população precisa se armar para garantir proteção para sua família e patrimônio, mostra que a polícia não serve para nada e que o Estado faliu. Você joga a questão da segurança, que deveria ser pública, na mão do cidadão. E isso é perigosíssimo. Hoje existe uma constatação de que vivemos um problema grave de segurança pública, mas arma não é a solução. Não cabe ao cidadão garantir a segurança das pessoas.

 Fonte: EL País.

Rio de Janeiro: 16 vítimas de balas perdidas em apenas dez dias

RIO

Viver na região metropolitana do Rio de Janeiro, que os turistas nunca visitam, pode ser um esporte de alto risco. Sandra Costa dos Santos, de 58 anos, acordou na madrugada desta terça-feira em sua casa em Bangu (zona oeste da cidade), por volta das 3h, sentindo muita dor. Pediu ajuda à filha, que acabou descobrindo o que parecia ser um projétil em sua cabeça. Sandra foi levada com urgência ao hospital, em Realengo, onde seu prognóstico é estável. Na mesma hora, na favela da Rocinha, a jovem de 21 anos Adriene Solan do Nascimento morria vítima de outra bala perdida durante um enfrentamento entre policiais militares e bandidos (supostamente traficantes) que os surpreenderam durante uma patrulha noturna e depois fugiram. Um pouco antes, a menina Lilian Leal de Moraes, 12 anos, recebeu um tiro na perna em Costa Barros, na zona norte; ela está fora de perigo, recuperando-se de uma cirurgia no hospital Albert Schweitzer.

Lilian, Sandra e Adriene são respectivamente as vítimas número 11, 12 e 13 de balas perdidas na Grande Rio de Janeiro nos últimos dez dias. Ao todo, ao menos 16 pessoas foram vítimas de balas perdidas neste período, sendo que quatro morreram (duas delas crianças). Onze casos aconteceram na capital, um em Niterói e outro em São Gonçalo. Alguns aconteceram em restaurantes, outros na rua. Asafe Willian Costa, de 9 anos, foi atingido na cabeça por uma bala perdida na tarde do domingo, num clube de Honório Gurgel, região onde ocorrem muitos tiroteios entre traficantes e policiais, quando saía da piscina para beber água. Não pôde se recuperar da morte cerebral. No dia 17 de janeiro, Larissa de Carvalho, de apenas 4 anos, teve morte imediata ao ser atingida por um tiro quando saía de um restaurante em Bangu com sua mãe e seu padrasto.

O secretário de Segurança Pública, José Mariano Beltrame, disse nesta terça-feira que os casos estão sendo investigados e afirmou ter informações sobre a existência de uma guerra entre facções do tráfico em algumas áreas de conflito não ocupadas pela polícia. “Vamos entrar nessas áreas, mas quando houver condições de manter a ocupação.” Nas últimas 10 semanas, foram apreendidas 1.236 armas em operações policiais.

Beltrame ressaltou que “a maior parte dos casos de balas perdidas não se deu em enfrentamentos com a polícia”, instituição que é fortemente criticada por sua violência (o Rio de Janeiro é o Estado com o maior número de mortes cometidas pelas mãos de policiais no Brasil, o país com mais homicídios do mundo); pelos casos recentes de corrupção e pela sensação geral de ineficácia diante do crime organizado, apesar da aposta firme feita seis anos atrás na chamada “política de pacificação”.

A ONG Rio de Paz organizou no último domingo um ato público na praia de Copacabana para conscientizar a população sobre a morte de crianças por balas perdidas na “cidade maravilhosa”. Com cartazes destacando a frase “a violência está matando nossas crianças”, pais e familiares de menores mortos pediram justiça, ao lado de uma cruz de três metros cravada na areia.

Fonte: EL País.

JUAN ARIAS: Para o Estado somos todos bandidos

RIOEstou há muitos anos neste país que amo, sobretudo suas pessoas. Muitas coisas mudaram desde que aterrissei pela primeira vez no Rio, onde ainda se podia caminhar pela rua e viajar de ônibus sem ter que ficar alerta por medo de ser vítima da violência urbana. O mesmo ocorria em São Paulo.

O Brasil avançou na consciência dos cidadãos e até em riqueza econômica, apesar de uns poucos continuarem crescendo cada vez mais do que a maioria. Há algo, porém, que no Brasil não só não avançou, como também retrocedeu. Por exemplo, no que se refere ao respeito à vida das pessoas.

Eu me pergunto tantas vezes, com dor e até com raiva, por que a vida de uma pessoa vale tão pouco e é esmagada a cada dia como se esmaga uma barata. Esse pouco apreço por ela faz com que nossa polícia, eternamente mal paga e mal preparada, sempre com licença para matar, seja a cada dia mais truculenta e corrupta.

Eu voltei a me perguntar lendo a sangrenta reportagem de minha colega María Martín neste jornal sobre o tiro disparado por um policial na cabeça de um jovem vendedor ambulante, que acabou morto no asfalto de uma rua da rica São Paulo.

Esse policial que atirou sem compaixão no ambulante, como se atira em um coelho no campo, não pensou que aquele jovem vendia suas coisas na rua porque talvez não tenha tido a possibilidade de fazer algo melhor na vida? Que poderia ter sido seu filho ou irmão? Que ele também tinha sonhos e desejo de continuar aproveitando a vida?

Vendo aquelas imagens feitas no lugar do crime pela nossa repórter María meu estômago se revirou de desgosto e a mente, de indignação, enquanto pensava que esses policiais que em vez de nos dar um sentido de segurança e proteção nos incutem a cada dia mais medo.

Pensei também que a nossa classe média ajuda os guardiães da ordem a disparar o gatilho da pistola sem tantos remorsos. Fomos nós que cunhamos a terrível frase de que “bandido bom é bandido morto”. E o respeito à vida? “É que eles também não respeitam a nossa”, se contrapõe. Mas isso leva à concepção de que o Estado existe não para nos defender sem necessidade de matar, mas para “executar”, e se for com tortura, melhor. E que todos acabamos sendo vítimas potenciais dessa loucura.

Há países, como os Estados Unidos, onde se um policial poderia ter prendido um criminoso sem lhe tirar a vida e fica comprovado que não o fez porque era mais fácil matá-lo, acaba sendo duramente punido.

É um problema de escala de valores. Quando a vida de um ser humano, criminoso ou santo, deixa de ter valor supremo, todos logo acabamos nos tornando carne de canhão. Nossa vida entra em liquidação, perde seu valor e dignidade.

Tudo isso, no Brasil parece mais evidente pelo fato de que o Estado trata os cidadãos não como pessoas em princípio honradas, mas como potenciais “bandidos”. Em outros países, o Estado parte do pressuposto de que o cidadão é do bem, que não mente, que não engana, que não procura, a princípio, violar a lei.

E é o Estado, se for o caso, que tem de demonstrar que não é assim, que esse cidadão é um delinquente e fraudador, e só então terá de ser punido.

Viram como nós, cidadãos, somos tratados no Brasil quando precisamos comprar algo, quando entramos em um cartório? Todo o papel é pouco para demonstrar que não somos bandidos, sem-vergonha, mentirosos, vigaristas. Nos pedem certificados e mais certificados, assinaturas e mais assinaturas, reconhecimento de firma, e ainda mais, comprovação com presença física de que essa assinatura é autêntica.

Em uma ocasião, quando comprei um pequeno imóvel em Madri, tudo durou 20 minutos num cartório. Assinamos o contrato de compra e venda. O proprietário me entregou a escritura e as chaves e eu entreguei o cheque da compra. No Brasil nos teríamos perguntado, e se o imóvel foi vendido duas vezes? E se nós dois não estivéssemos nos enganando? E, e, e, e…..! Quantos “es” e quantos medos de que no fundo sejamos de verdade uns bandidos que só queremos enganar!

Essa possibilidade de que possamos estar enganando sempre se deve ao fato de que perante as autoridades, ante a polícia, ante o Estado, todos somos sempre vistos como bandidos em potencial. Como me disse um amigo meu, para meu espanto: “É que todos nós, brasileiros, somos todos um pouco bandidos. Se nós podemos enganar, fazemos isso”.

Não acredito. Sempre pensei que até nas sociedades mais violentas e atrasadas as pessoas de bem, honradas, que não desejam enganar são infinitamente mais numerosas do que os bandidos. Do contrário, o mundo inteiro seria há muito tempo um inferno.

É assim no Brasil? Enquanto se continuar pensando e agindo como se a vida humana tivesse menos valor do que um verme e ninguém se espantar quando é sacrificada com violência e sem remorsos, às vezes até por uma insignificância, talvez tenhamos que reconhecer que esse inferno existe também aqui.

Isso é o que recordam as mais de 50.000 vidas, todas elas de jovens negros ou mulatos, pobres quase em sua totalidade, que acabam assassinados a cada ano, mais que em todas as guerras em curso no Planeta. Cada vez que um policial acaba com a vida de uma pessoa na rua, às vezes por uma mesquinharia, continuará sendo alimentada, pela outra parte, a dos cidadãos e dos mesmos bandidos, uma cadeia infernal de desejo de vingança que continuará nos esmagando e humilhando.

Até quando? Irá despertar alguma vez este país de tantas maravilhas, de tantas pessoas fantásticas, com desejo de viver em paz, sem serem tratadas como se fossem todas bandidos, ou continuará deixando atrás de si a cada dia tristes trilhas de sangue e medo ante a impassividade e a impotência do Estado?

Juan Arias é colunista do EL País.

BRASIL: A Copa da Repressão

Rio

RIO DE JANEIRO – Faltando 50 dias para o início da Copa do Mundo, as autoridades estaduais e federais se deparam com o fracasso da Política de Segurança, fundada na truculência contra o povo pobre brasileiro, posta em prática para assegurar o sucesso da Copa das Copas.

A imprensa internacional, como ocaso do Jornal El País, veicula diariamente os acontecimentos que a mídia brasileira tenta esconder, a exemplo das imagens dos conflitos de terça-feira (22) no Rio de Janeiro, amplamente divulgadas, lançando dúvidas acerca da capacidade de o Brasil organizar um evento de grandes proporções sem incidentes.

Os conflitos abordados na matéria aconteceram por volta das 18h desta terça-feira, quando uma manifestação tomou conta do entorno da comunidade Pavão-Pavãozinho, na Zona Sul do Rio. O protesto teve carros queimados, ruas foram fechadas e o dançarino Douglas Rafael da Silva Pereira foi encontrado morto.

Na matéria, o jornal diz também que armas de guerra voltaram a se disseminar nos subúrbios cariocas em paralelo ao sentimento de insatisfação nas comunidades com a ineficiência das Unidades de Polícia Pacificadora, que seriam vistas como uma versão romantizada da Polícia Militar – conhecida pelos altos índices de corrupção “até a medula” e truculência, de acordo com a reportagem.

El País chama atenção ainda para dois fatores que colocariam o Brasil em uma situação bastante delicada. O primeiro seria um forte ressentimento acumulado pelos moradores das favelas por terem sido tradicionalmente tratados pela sociedade e pelos governantes como “cidadãos de segunda categoria”. Por conta disso, os moradores dessas comunidades estariam se sentindo ainda mais estimulados pelos protestos que estouraram no país todo em junho de 2013 e hoje em dia estariam se manifestando com ainda mais fúria.

As favelas estariam mais propensas a atacar as unidades policiais que eles acusam de violação de direitos, incendiar veículos, fechar ruas e avenidas em manifestações.

O segundo fator que o jornal espanhol enfoca são as recentes tensões policiais terem acontecido justamente no bairro de Copacabana. Considerado pelo jornal a parte mais turística do Rio, o bairro foi palco de um aumento da criminalidade, de operações policiais e, desde setembro de 2013.

Somada a isso tudo pesa contra a ação policial o número alarmante de homicídio de populares, passando já dos 500 casos não investigados, e o desaparecimento de outros milhares de moradores da noite para o dia.

Segundo o jornal, as promessas feitas pela presidente Dilma Rousseff para acalmar as manifestações de junho de 2013 nunca chegaram a ser efetivamente colocadas em prática e isso está criando uma situação de insatisfação que pode complicar a vida dos governantes e da própria Fifa nesse momento e afastar os turistas do evento.