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Isto Posto… Chamar o Dunga?

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Muito se falou após a derrota de 7X1 para a Alemanha da necessidade inadiável de mudanças nas estruturas do futebol brasileiro. O país, consternado com a sucumbência humilhante da seleção canarinho frente ao representante maior, hoje, do futebol moderno, versátil e objetivo, conclamava por reformas que pudessem devolver ao país o ‘status’ perdido de celeiro de craques e jogadas invejáveis, que fizeram do Brasil a denominada politicamente de “Pátria de Chuteiras”, fonte de enriquecimento de cartolas e mantra propagandístico utilizado por políticos e governos para exacerbar o patriotismo do povo através de um ufanismo imbecilizante.

No entanto, em que pesem as reivindicações de torcedores e jornalistas, a CBF, gestora maior do futebol arte brasileiro, no primeiro gesto em direção – ou na contramão – das mudanças almejadas por todos anuncia como novo treinador da escrete canarinho o retorno de um velho conhecido, o Dunga, cuja experiência profissional como treinador perpassa pela eliminação da copa de 2010 frente a Holanda e a ausência, desde então, de propostas de trabalho.

Contudo, ingenuidade seria acreditar que outra atitude pudesse ser tomada pelo maior responsável por transformar uma modalidade desportiva tão amada em nosso país num antro de corrupção, traição e mentiras e injustiças como se pode justamente imputar à Confederação Brasileira de Futebol. Pois, a realidade do futebol no Brasil há muito tempo é bem diferente do que se anuncia aos quatros cantos pela imprensa descompromissada a serviço da cartolagem perniciosa.

A face verdadeira do futebol em nosso país se consubstancia, já há tempos elastecidos, numa mentira sem tamanho. E o que o cotidiano nos desvela diz respeito a uma modalidade esportiva desprovida de profissionalismo, e não a profusão de “Neymares”, com mais de cem mil atletas cavando seu pão diário num universo em que pouco menos de cinco por cento consegue auferir com seu trabalho salário maior que o mínimo, enquanto cartolas inescrupulosos se locupletam da noite para o dia.

Isto posto, caro torcedor, não alimente o sonho de que reformas sérias serão feitas no futebol para sanear a sujeira em que os cartolas o transformaram. Continuaremos, sobretudo, assistindo ao espetáculo horrendo da violência e da ganância travestidos de esporte, com estádios vazios, partidas deprimentes num campeonato insípido, porém suficiente para assegurar o lucro de abutres afeitos à fortuna e avessos ao trabalho.

Então, se nada mais se pode fazer, chama o Dunga para conter a choradeira.

Por: Adão Lima de Souza

O Brasil da TV e o Brasil real.

Copa

A socióloga Maria Eduarda da Mota Rocha, analisando o público brasileiro da Copa, chama atenção para um fenômeno ainda fortemente presente na sociedade brasileira, a composição de uma etnia preponderantemente branca mostrada pela televisão que destoa da realidade de nosso país.

Segundo a pesquisadora:

A imprensa internacional já se deu conta da discrepância entre a composição racial brasileira e os rostos que vemos pela TV nas arquibancadas dos estádios, durante os jogos da Copa. A julgar por essas imagens, os desavisados poderiam até pensar que o Brasil é um país de brancos.

Na verdade, a quase ausência de negros e mestiços nas arquibancadas dos estádios reproduz um fenômeno muito antigo: a invisibilidade dos pobres na sociedade brasileira.

Até a década de 1970, a TV se voltava a um público quase exclusivamente composto pelas elites e classes médias altas. As tramas e ambientes da telenovela, por exemplo, tinham uma clara função pedagógica: dizer como deviam se comportar e consumir os membros daquelas classes, tanto os mais antigos quanto aqueles que ascendiam socialmente aproveitando-se dos postos de trabalho e oportunidades de negócio abertos pela intensa modernização capitalista do período.

A TV, hoje, tem respondido, sobretudo, com programas policialescos, que retratam casos de violência ocorridos principalmente na periferia, e que estigmatizam os moradores destes lugares diante de outros públicos e de si próprios. Tratando a violência em chave melodramática, tais programas baseiam-se nas figuras da “vítima” e do “bandido” como tipos extremos, a bondade e a maldade em sua pureza.

Desta forma, moralizam um tema que precisa ser analisado sociologicamente e atacado politicamente: as formas pelas quais a violência se reproduz dia após dia, assentada em condições sociais, econômicas, políticas e culturais profundas.

A dualidade entre a visão do Brasil como lugar de festa e de violência é uma marca profunda da nossa experiência de brasileiros. Desde a criação do mito de que somos um lugar onde não existe racismo, na década de 1930, a cultura parece tentar juntar o que a sociedade separa, e a festa é esse momento de conjunção. Entretanto, em muitas ocasiões, somos obrigados a nos confrontar com a fragilidade dessa sutura.

Para superar tais dualidades, é fundamental recolocar em pauta o problema da desigualdade brasileira, gritante sob um ponto de vista político, cultural e econômico, apesar da recente tendência de distribuição de renda. Ela reverbera tanto na forma da violência quanto da festa que busca a sua superação.

Maria Eduarda da Mota Rocha é doutora em Sociologia e professora adjunta da UFPE.

 

Sobre mordidas e legados

dinesEm matéria de repercussão, sem dúvida, é a Copa das Copas. Obama, o cestinha, acendeu a luz verde ao posar para fotos a bordo do Air Force One assistindo ao embate da sua seleção com a Alemanha e a porta-voz do Departamento de Estado compareceu ao briefing matinal com a imprensa com o agasalho da seleção ianque.

Também no âmbito da geopolítica o resultado é superlativo: despachados de volta três gigantes (Inglaterra, Itália e Espanha), a Europa futebolística assemelha-se à Europa política, amarrada a velhos vícios, desfibrada. A esta altura do campeonato, Américas e África consolidam-se como as grandes reservas para o futebol do futuro. O que não impedirá que o Velho Mundo através da Alemanha, Holanda e França ainda venham a empalmar a Jules Rimet na final da 20a edição do Mundial de Futebol.

A globalização está ganhando de goleada: a dentada de Luis Suárez no italiano Chielini tornou-se, a partir da última terça, a peça central das preocupações humanas só perdendo neste segmento para uma abocanhada mais desastrosa e celebrada – a de Eva mordiscando a maçã proibida e experimentado as delícias do pecado. Ambas mudaram o mundo, trouxeram inapelavelmente a questão do crime e castigo para a realidade de bilhões de anjos e vilões.

O mago Lula da Silva estava certo quando apostou todas as fichas no pleito do Brasil para sediar a Copa de 2014. Já o estadista que atende pelo mesmo nome, elegeu um poste, porém não cuidou para que ficasse firme e ligado à rede. Coisas da política.

O pressentido caos ainda não se materializou e certamente não se materializará, mas o preço pode ser alto: o país foi obrigado a parar. Sem sistemas de transporte de massa nas cidades-sede a opção ao caos foram férias remuneradas. São Paulo, a imparável, parou nos últimos seis dias (desde o confronto com os camaronenses), concentrada diante de altares de tela plana, em botecos ou churrascarias.

Turistas e jornalistas estrangeiros que não conheciam o país admiram-se: estavam preparados para uma bagunça, esperavam o auê, baixaram expectativas e exigências, parecem felizes. No inverno ameno, um povo festeiro, contenta-se em contagiar os visitantes e faturar alguns trocados. Sua magia é tornar tudo distante: apesar do céu azul, daqui não se enxerga a Ucrânia, nem o Iraque, sequer a vizinha Argentina.

A sensação do “day after” já se manifesta em Cuiabá, Natal, Curitiba e Manaus, enquanto suas arenas ainda com cheiro de tinta fresca começam a metamorfosear-se em elefantes brancos e o adjetivo faraônico começa a ser entendido.

Ainda em andamento, sem campeão à vista e muitas surpresas pela frente, a Copa das Copas já entrou para a história com um acervo de lições imperecíveis. Submetidos às aflições de prazos rígidos e padrões impecáveis, saímos pela tangente oferecendo ao mundo a idéia da precariedade feliz, da transitoriedade permanente, do relaxar e gozar, do vai levando e deixa rolar.

Intraduzíveis, estas sensações logo estarão sendo clonadas e o mundo, sem o perceber, se sentirá mais feliz. Nossos craques não mordem, em compensação as autoridades não estão nem ai para os legados.

Alberto Dines é colunista do EL País.

FELIPÃO: O Brasil imita Simeone

Brasil

Diz a edição brasileira da revista GQ que durante um mês que dura a Copa o treinador Luiz Felipe Scolari é o verdadeiro presidente do país. Scolari adora essa ideia. Populista visceral, o homem presta menos atenção às mensagens esportivas que às políticas. Por isso, usa seus jogadores mais carismáticos, incitando-os a transmitir para o povo as ideias difíceis de digerir. Como a que emitiu por intermédio do seu capitão, Thiago Silva, em 4 de junho. Em entrevista coletiva, o rapaz disse que, para ser campeão, a seleção do Brasil precisaria seguir os passos do do Atlético de Simeone.

“Hoje, no treino com o Daniel Alves e o Ramires, pedimos maior atenção na fase defensiva”, começou Thiago, progressivamente nervoso naquela entrevista. “A gente sabe que se não sofrermos gols nossas chances de ganhar as partidas por 1 x 0 são muito grandes. O objetivo é não levar gol. A parte defensiva da seleção é muito sólida, e acredito que será preciso trabalhá-la muito mais. Eu tenho confiança total em todos os jogadores no setor defensivo. Espero que acertemos nesse objetivo de sofrer zero gol até chegar à ansiada final do Maracanã.”

Enviado por seu chefe, Thiago continuou mergulhando no atoleiro: “Temos que fazer como o Atlético de Madri, que chegou a uma final da Champions porque quase não sofreu gols. Na final, infelizmente, marcaram quatro neles, mas foi uma temporada muito proveitosa para o Atlético. Se continuarmos nesse caminho, e principalmente pensamos em defender, poderemos ter sucesso mais adiante”.

“É um exemplo a seguir por seu estilo de jogo organizado, fechado”, diz o treinador da seleção.

Isto Posto… A Copa das Etnias.

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Duas coisas mais chamaram minha atenção nessa que o governo politicamente denominou de a “Copa das Copas”. A primeira, a grande mistura de raças dentro dos gramados que fazem desse mundial no Brasil “A Copa das Etnias”, contribuindo fortemente para o combate ao racismo no futebol, pois é notória a presença marcante de jogadores afrodescendentes em todas as equipes, principalmente europeias, oriundos de diversas nacionalidades, a exemplo da seleção francesa, cujo jogador de maior destaque no momento, Karim Benzema, não disfarça sua origem argelina, suas raízes árabes.

Mesmo a Holanda, uma das primeiras seleções a convocar jogadores negros, porém fortemente marcada, durante muito tempo, por oposições racistas, não escapa ao reconhecimento de que um de seus melhores jogadores, apesar dos holofotes mirados para Robben, Van Persie, Sneijder, é sem dúvida o meio-campista Nigel de Jong, enquanto a “squadra azzurra” depende inteiramente do atacante Mário Balotelli.

Decepcionante, porém, mostra-se o Brasil, com seu histórico escravocrata, cujo preconceito racial permanecendo velado se evidencia nos cabelos alisados de Neymar, tão próximos do padrão de beleza estabelecido como superior, quando deveria exaltar sua negritude e a mestiçagem que fazem desse país objeto de admiração pelo resto do mundo.

Isto posto, para terminar, a segunda coisa chamativa é o intenso calor dos estados brasileiros, derrotando a maioria das seleções europeias ainda no primeiro tempo, pois diminui seus rendimentos. Entretanto, sob este aspecto não recai nenhum tipo de preconceito já que o sol brilha para todos.

Por: Adão Lima de Souza

A Odebrecht é denunciada por trabalho escravo e tráfico internacional de pessoas

EstádioO Ministério Público do Trabalho (MPT) entrou, na sexta-feira 13, com uma ação contra o grupo Odebrecht, responsável pelas obras de três estádios-sede da Copa deste ano, por condição degradante de trabalho, trabalho escravo, tráfico internacional de pessoas, cerceamento de liberdade, retenção de documentos e intermediação de mão de obra.

As denúncias são relacionadas às obras de construção de uma usina de cana-de-açúcar em Angola, entre os anos 2011 e 2012 e foram protocoladas depois da publicação de uma reportagem pela BBC Brasil no final do ano passado.

Se for condenada, a empresa brasileira terá de pagar uma indenização de 500 milhões de reais. “Além da multa, que foi calculada sob os critérios de gravidade dos fatos e capacidade financeira da empresa, a Odebrecht ainda estará proibida de receber financiamento do BNDES para futuros projetos”, explicou o procurador Rafael de Araújo Gomes.

Segundo Gomes, os crimes trabalhistas foram cometidos contra cerca de 500 trabalhadores brasileiros que foram levados a Angola para trabalhar nas obras que pertencem à empresa Biocom, companhia angolana da qual a Odebrecht é sócia, juntamente com as angolanas Sonagol Holdings e Damer Industria.

 “Com relação às condições degradantes, a Odebrecht já foi condenada em outras dezenas de ações judiciais”, diz Gomes. “Em 2008, a empresa foi notificada por esse mesmo motivo em outra obra de Angola”, completa.

Além da submissão a condições degradantes de trabalho, a empresa ainda é acusada de aliciamento dos trabalhadores recrutados, “primeiramente em território nacional e a seguir no exterior, tratando-se de hipótese típica de tráfico de seres humanos”, segundo o documento.

Os aliciados acabaram se tornando, não só imigrantes ilegais, pois não tinham o visto correto para a permanência no país, pois o procedimento adotado pela Biocom / Odebrecht era de imediatamente tomar dos trabalhadores os seus passaportes, diz o documento.

A Odebrecht, Fundada na década de 40 na Bahia, é hoje um dos maiores conglomerados brasileiros, atuante nas áreas de engenharia, construção, produtos petroquímicos e químicos.

É a responsável por obras como os estádios do Itaquerão, Maracanã e Arena Pernambuco, ambos sedes da Copa do Mundo deste ano, além do Aeroporto Tom Jobim e Santos Dumont (ambos no Rio de Janeiro), além da linha amarela do metrô de São Paulo, entre outros empreendimentos, no Brasil e nos Estados Unidos.

No ano passado, a empresa faturou 97 bilhões de reais, e teve lucro líquido de 491 milhões de reais.

Isto Posto… O legado da Copa: Os elefantes brancos

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Muito se tem falado dos gastos excessivos na construção de estádios para a Copa no Brasil. Alegando uns que o dinheiro seria mais bem empregado em saúde, educação e segurança. Enquanto o governo, aturdido com as manifestações diárias nos grandes centros do país, tenta rebater as críticas afirmando, em caríssimos comerciais, que o legado existe e é de todo povo brasileiro, já que os investimentos, segundo a propaganda oficial, não se limitaram às arenas, mas, também a realização de obras de mobilidade urbana indispensáveis ao desenvolvimento das cidades sedes.

No entanto, por mais bem elaboradas que sejam as peças publicitárias relativas ao mundial, somado ao renitente e reticente discurso uníssono de nossas autoridades, o povo não conseguiu, ainda, vislumbrar com a mesma euforia do governo e da FIFA a importância desse excepcional legado à modernização desse país habituado ao lodaçal imundo em que se transformou a gestão política de nossas cidades e a desfaçatez com que se lança mão de desculpas esfarrapadas, como se tudo fosse justificável ante a pretensa estupidez de nosso povo.

E é talvez aí, nesse afã equivocado dos políticos de que qualquer mentira calha bem como justificativa, que o cidadão brasileiro encontrou dificuldade enorme de digerir a estratosférica soma de dinheiro gasto com a construção de estádios que sediarão algumas poucas partidas, como as arenas de Manaus, Cuiabá, Natal, Fortaleza, Recife, e depois do mundial ninguém sabe dizer o que será feito delas, já que estão situadas em Estados de nenhuma referência no futebol.

Diante disso, fica a pergunta: Quem assumirá a manutenção desses estádios depois da Copa? Os municípios, cujas finanças são comprometidas pela corrupção e a partilha injusta dos impostos arrecadados pelo Governo Federal? Ou, quem sabe, os Estados que por razões semelhantes as dos municípios, patinam ano a ano nos resultados econômicos pífios? Quiçá o Governo Federal, sempre tão prestativo com os Estados e municípios?

Isto posto, só restará o abandono desses elefantes brancos, se não se puder contar com a generosidade do contribuinte.

Por: Adão Lima de Souza

“Baixar o cacete nos vândalos”

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O ex-atacante da Seleção Ronaldo Fenômeno afirmou nesta quinta-feira que é preciso “descer o cacete” em manifestantes mascarados que promovam vandalismo durante protestos. A afirmação foi feita durante uma sabatina com o ex-jogador, realizada pelo jornal “Folha de S.Paulo”.

Integrante do Comitê Organizador Local da Copa (COL), Ronaldo disse também que faltou planejamento para as obras de infraestrutura e que sua participação na organização do evento é “mais de imagem”. Esta semana, em entrevista à agência Reuters, ele havia dito que estava envergonhado com o país.

— Acho que os protestos são sempre válidos, os protestantes que vão às ruas pacificamente exigir o direito de cidadão que cada um tem. A partir do momento que têm vândalos no meio, mascarados, a segurança pública tem de conter essas pessoas, esses infratores.

Vamos separar os vândalos, os mascarados de um lado. Na minha opinião, tem que baixar o cacete neles, tem que tirar eles da rua, prender todos eles. Agora, a população manifestar eu acho muito válido, com educação, sem violência — disse Ronaldo.

Ronaldo disse que apenas 30% do prometido em obras de infraestrutura serão entregues até a Copa do Mundo.

A copa já era! – Parte I

taca_copaO presente texto tem o propósito de apresentar onze argumentos, do goleiro ao ponta-esquerda, para demonstrar que a Copa já era! Ou seja, que já não terá nenhum valor para a sociedade brasileira e, em especial para a classe trabalhadora, restando-nos ser diligentes para que os danos gerados não se arrastem para o período posterior à Copa.

1. A perda do sentido humano

O debate entre os que defendem a causa “não vai ter copa” e os que afirmam “vai ter copa” está superado. Afinal, haja o que houver, o evento não vai acontecer, ao menos no sentido originariamente imaginado, como instrumento apto a gerar lucros e dividendos políticos “limpinhos”, como se costuma dizer, pois não é mais possível apagar os efeitos deletérios que a Copa já produziu para a classe trabalhadora brasileira. É certo, por exemplo, que para José Afonso de Oliveira Rodrigues, Raimundo Nonato Lima Costa, Fábio Luiz Pereira, Ronaldo Oliveira dos Santos, Marcleudo de Melo Ferreira, José Antônio do Nascimento, Antônio José Pitta Martins e Fabio Hamilton da Cruz, mortos nas obras dos estádios, já não vai ter Copa!

Aliás, a Copa já não tem o menor valor para mais de 8.350 famílias que foram removidas de suas casas no Rio de Janeiro, em procedimento que, como adverte o jornalista Juca Kfouri, no documentário, A Caminho da Copa, de Carolina Caffé e Florence Rodrigues, “lembram práticas nazistas de casas que são marcadas num dia para serem demolidas no dia seguinte, gente passando com tratores por cima das casas”.

Essas práticas, segundo relatos dos moradores, expressos no mesmo documentário, incluíram invasões nas residências, para medir, pichar e tirar fotos, estabelecendo uma lógica de pressão a fim de que moradores assinassem laudos que atestavam que a casa estava em área de risco, sob o argumento de que na ausência de assinatura nada receberiam de indenização, o que foi completado com o uso da Polícia para reprimir, com extrema violência, os atos de resistência legítima organizados pelos moradores, colimando com demolições que se realizaram, inclusive, com pessoas ainda dentro das casas.

As imagens do documentário mencionado são de fazer chorar e de causar indignação, revolta e repúdio, como o são também as imagens da violência utilizada para a desocupação de imóvel da VIVO na zona norte do Rio de Janeiro, ocorrida no dia 11 de abril de 2014, onde se encontravam 5.000 pessoas.

Lembre-se que as remoções para a Copa ocorreram também em Cuiabá, Curitiba, Belo Horizonte, Porto Alegre, Recife, Manaus, São Paulo e Fortaleza, atingindo, segundo os Comitês Populares da Copa, cerca de 170 mil famílias em todo o Brasil.

A Copa já não tem sentido para o Brasil, como nação, visto que embora sejam gastos cerca de R$ 30 bilhões para o montante total das obras, sendo 85% vindos dos cofres públicos, a forma como se organizou – ou não se organizou – a Copa acabou abalando a própria imagem do Brasil.

Ou seja, mesmo se pensarmos o evento do ponto de vista econômico e ainda que, imediatamente, se possa chegar a algum resultado financeiro positivo, considerando o que se gastou e o dinheiro que venha a ser atraído para o mercado nacional, é fácil projetar um balanço negativo em razão da quebra de confiabilidade.

Se o Brasil queria se mostrar, como de fato não é, para mais de 2 bilhões de telespectadores, pode estar certo de que a estratégia já não deu certo. A propósito, a própria FIFA, a quem se concedeu benefícios inéditos na história das Copas, tem difundido pelo mundo uma imagem extremamente negativa do Brasil, que até sequer corresponde à nossa realidade, pois faz parecer que o Brasil é uma terra de gente preguiçosa e descomprometida, quando se sabe que o Brasil, de fato, é um país composto por uma classe trabalhadora extremamente sofrida e dedicada e onde se produz uma inteligência extremamente relevante em todos os campos do conhecimento, mas que, enfim, serve para demonstrar que maquiar os nossos problemas sociais e econômicos não terá sido uma boa estratégia.

2. Ausência de benefício econômico

Mesmo que entre perdas e ganhos o saldo econômico seja positivo, há de se indagar qual o preço pago pela população brasileira, vez que restará a esta conviver por muitos anos com o verdadeiro legado da Copa: alguns estádios fantasmas e obras inacabadas, nos próprios estádios e em aeroportos e avenidas, além da indignação de saber que os grandes estádios e as obras em aeroportos custaram milhões aos cofres públicos, mas que, de fato, pouca serventia terão para a maior parte da classe operária, que raramente viaja de avião e que tem sido afastada das partidas de futebol, em razão do processo notório de elitização incrementado neste esporte.

Oportuno frisar que o dinheiro público utilizado origina-se da riqueza produzida pela classe trabalhadora, vez que toda riqueza provém do trabalho e ainda que se diga que não houve uma transferência do dinheiro público para o implemento de uma atividade privada, vez que tudo está na base de empréstimos, não se pode deixar de reconhecer que foram empréstimos com prazos e juros bastante generosos, baseados na previsibilidade de ganhos paralelos com o evento, ganhos que, no entanto, já se demonstram bastante questionáveis.

No caso do estádio Mané Garrincha, em Brasília, por exemplo, com custo final estimado em R$1,9 bilhões, levando-se em consideração o resultado operacional com jogos e eventos obtidos em um ano após a conclusão da obra, qual seja, R$1.137 milhões, serão precisos 1.167 anos para recuperar o que se gastou, o que é um absurdo do tamanho do estádio, ainda que o Ministro do Esporte, Aldo Rebelo, e o secretário executivo da pasta, Luis Fernandes, tenham considerado o resultado, respectivamente, “um êxito” e “um exemplo contra o derrotismo”.

O problema aumenta, gerando indignação, quando se lembra que não se tem visto historicamente no Brasil – desde sempre – a mesma disposição de investir dinheiro público em valores ligados aos direitos sociais, tais como educação pública, saúde pública, moradias, creches e transporte.

O que se sabe com certeza é que a FIFA, que não precisa se preocupar com nenhum efeito social e econômico correlato da Copa, obterá um enorme lucro com o evento. “Uma projeção feita pela BDO, empresa de auditoria e consultoria especializada em análises econômicas, financeiras e mercadológicas, aponta que a Copa do Mundo de 2014 no Brasil vai render para a Fifa a maior arrecadação de sua história: nada menos do que US$ 5 bilhões entrarão nos cofres da entidade (cerca de R$ 10 bilhões).”

 *Jorge Luiz Souto Maior  – professor livre-docente da Faculdade de Direito da USP e membro da AJD – Associação Juízes para a Democracia.

A escalada da Violência na Cidade Maravilhosa

Rio

RIO DE JANEIRO – Segundo o Instituto de Segurança Pública (ISP), os homicídios dolosos aumentaram 22%, passando de 1.197 entre janeiro e março de 2013 a 1.459 no mesmo período deste ano. A polícia também matou mais. Os denominados autos de resistência (quando os agentes matam em defesa própria) dispararam em 59%, pulando de 96 mortes em 2013 para 153 em 2014. Os roubos a pedestres também aumentaram em 45% no primeiro trimestre (13.822 em 2013 e 20.152 em 2014).

Diante da publicação dessas alarmantes estatísticas sobre o crime, a quase 40 dias do início do Mundial, Governo do Rio, em uma decisão que se contradiz com o mantra pronunciado até agora de que os esforços para garantir a segurança representam um patrimônio duradouro para a cidade, e não apenas mais uma medida ocasional para controlar a violência durante o mês da Copa, determinou o envio às ruas de toda a sua equipe policial a partir desta segunda-feira.

Um contingente adicional de dois mil policiais já estava previsto para o início do evento, mas o secretário de Segurança do Rio, José Mariano Beltrame, decidiu adiantar a medida com o propósito de mandar uma mensagem de confiança ao mundo todo.

Durante as últimas semanas, várias favelas foram palco do conflito armado entre policiais militares e traficantes que, em alguns casos, culminaram com vítimas fatais.

Os vizinhos destas periferias, fartos de serem tratados como cidadãos de segunda classe e descrentes do denominado processo pacificador, parecem ter herdado o espírito contestador das mobilizações do ano passado e hoje protagonizam os principais protestos registrados na cidade, manifestando-se contra a violência policial que costuma cobrar vidas de forma injustificada.

Os agentes não terão dias de folga e receberão horas extras para evitar o descontentamento da tropa ou a possibilidade de que surjam movimentos grevistas durante os próximos dois meses.

Por: Adão Lima de Souza
Fonte: El País.