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SOBRE UMA QUESTÃO DO SISTEMA DIFUSO NA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL

Mauro Cappelleti afirma que o Controle de Constitucionalidade é apenas um aspecto, o mais importante, da Jurisdição Constitucional. Ousamos discordar. Deve-se entender o controle de constitucionalidade como mais amplo do que a Jurisdição Constitucional. O controle de constitucionalidade envolve a participação de todos os poderes e formas organizativas societárias, enquanto que a Jurisdição Constitucional envolve o exercício exclusivo da Jurisdição.

No que concerne ao sistema difuso na jurisdição constitucional, emerge questão processual central acerca do modo de propositura da questão constitucional, isto é, do incidente de inconstitucionalidade.

Segundo lição essencial de Ovídio A. Baptista da Silva, desde os atos postulatórios até a sentença, o processo é feito de questões que constituem o objeto do processo e constituem o limite dentro do qual se exerce a jurisdição. Muito embora diga que ficam no plano lógico, no âmbito da subsunção, no sistema difuso, tem correlação profunda com o pedido principal e ao provimento solicitado ao Estado-Juiz.

Afirma o mestre:

“A declaração incidental é uma demanda que tem por fim a obtenção de uma sentença sobre a chamada questão prejudicial, de que depende a existência da pretensão contida na demanda prejudicada.’’[1]

Depreende-se, portanto, que a questão prejudicial é a questão central cuja decisão depende do enfrentamento de uma questão apresentada como fundamento- questão prejudicada. Nesses casos, a coisa julgada não se estende à questão prejudicada na medida em que o Juiz a conhece de maneira incidente e não de maneira principal, podendo, inclusive, a questão ser deduzida novamente em outra relação jurídico-processual se não houver decisão com eficácia geral sobre a questão.

Surge, então, a problemática, não debatida pela dogmática constitucional nem pelos processualistas, sobre a natureza da decisão, em sistema difuso, que conhece da questão incidental.

O SupremoTribunal Federal lança mão da expressão transcendência dos motivos determinantes e labora em erro. A sentença tem três elementos: o relatório, a fundamentação e o dispositivo. É regra consolidada que só faz coisa julgada a parte dispositiva e, podemos acrescentar, referente à parte da questão prejudicial. Os motivos determinantes não são transcendentes no sentido de vincular. Podem até ter efeito persuasivo para outras decisões figurando como norte argumentativo, mas, não estando inseridos na parte dispositiva, não tem o condão de vincular as partes nem de serem dotados de eficácia geral.

Poderiam os códigos, ao regular o incidente de inconstitucionalidade nos âmbitos dos tribunais, conferir à decisão que resolve a questão incidente a força de coisa julgada? Não. Porque seria uma alteração no sistema de competência gizado na constituição. Portanto, enquanto não houver decisão em sistema concentrado sobre a questão apresentada incidentalmente, é possível deduzir a matéria dentro do arco possível de controvérsia que, conforme Chaim Perelman, caracteriza o direito. Preferimos chamar de conflito de interpretação, numa referência à gênese da hermenêutica.

Por: Luís Eduardo Gomes do Nascimento, Advogado e Professor da UNEB.


[1] BAPTISTA DA SILVA, Ovídio A. Curso de processo civil, volume 1: processo de conhecimento. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2006, p. 311.