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Há juízes pintados para a guerra
Numa entrevista ao repórter Fausto Macedo, o presidente da Associação de Juízes Federais, Roberto Veloso, defendeu o auxílio-moradia de R$ 4.300 mensais livres de impostos pago aos seus pares e aos procuradores.
Uma parte de sua argumentação é sólida, pois, se o magistrado ou o procurador é transferido para outra cidade, faz sentido que receba algum auxílio. Quando Macedo levantou o tema do servidor que recebe o auxílio tendo casa própria na cidade em que vive há anos, Veloso respondeu que “não há uma ilegalidade no pagamento”.
“Eu me referia a uma preocupação de caráter moral”, esclareceu Macedo.
“Não estamos com essa preocupação. Não é uma pauta nossa”, respondeu o presidente da Ajufe.
Alô, alô, Brasil, quando um juiz tem um pleito em nome de sua classe e diz que não se preocupa com a sua moralidade, a coisa está feia.
Segundo a Advocacia-Geral da União, o auxílio-moradia custa R$ 1 bilhão por ano. Dentro da lei, somando-se todos os penduricalhos dos servidores do Judiciário da União e dos Estados, chega-se a cifras assustadoras.
Um relatório divulgado pelo Conselho Nacional de Justiça em janeiro passado estimou que em 2015 eles custaram R$ 7,2 bilhões. (As 30 toneladas de ouro tiradas de Serra Pelada valeriam R$ 4,6 bilhões em dinheiro de hoje.)
O problema dos penduricalhos volta para a pauta quando se sabe que 7 em 10 juízes ganham acima do teto constitucional de R$ 33 mil.
Na ponta do realismo fantástico, um juiz paulista que foi aposentado e cumpre pena de prisão em regime semiaberto por crime de extorsão recebeu em agosto passado um contracheque de R$ 52 mil. Tudo dentro da lei.
Os penduricalhos e os salários que produzem estão corroendo a imagem do Judiciário, logo a dele, onde uma centena de magistrados e procuradores fazem a grande faxina iniciada pela Lava Jato.
Essa questão pecuniária caiu no meio de um pagode, no qual ministros do Supremo se insultam, Gilmar Mendes descascou a Procuradoria-Geral de Rodrigo Janot e foi por ele acusado de “decrepitude moral”.
Desde maio está no gavetão da presidente do STF, ministra Cármen Lúcia, um pedido de Janot para que o ministro seja impedido de julgar casos envolvendo o empresário Eike Batista.
Nas razões que apresentou para desqualificar o pedido de Janot, Gilmar Mendes incluiu um provérbio português como epígrafe: “Ninguém se livra de pedrada de doido nem de coice de burro”. Não deu outra.
Caiu na rede um áudio atribuído ao juiz Glaucenir Oliveira, titular da Vara Eleitoral de Campos (RJ), que mandara prender o ex-governador Anthony Garotinho, solto por Gilmar.
Em inédita baixaria, o juiz disse que “eu não quero aqui ser leviano, estou vendendo peixe conforme eu comprei, de comentários ouvidos aqui em Campos hoje. […] O que se cita aqui dentro do próprio grupo dele [Garotinho] é que a quantia foi alta. […] A mala foi grande.”
Esse é o preço cobrado ao espírito de corpo do Judiciário. Em 2011 o juiz Glaucenir dirigia sem cinto e viu que estava sendo multado por uma guarda municipal. Deu ré, carteirou-a e insultou-a.
Quando ela disse que o levaria à delegacia, o magistrado informou: “Quem vai te conduzir sou eu”. Se ele não pagou a multa, a conta ficou para Gilmar Mendes. Ninguém se preocupa quando uma guarda municipal leva uma pedrada.
Por: Elio Gaspari, Folha de S.Paulo
Clarissa Garotinho: Prisão do meu pai foi abuso de poder
A deputada federal Clarissa Garotinho chorou no plenário da Câmara, hoje, em Brasília, ao falar sobre a prisão de seu pai, Anthony Garotinho (PR). Ela chamou a remoção do ex-governador do Rio de Janeiro para o presídio de Bangu, na última sexta-feira (18), de “abuso de autoridade”.
Clarissa Garotinho afirmou que sua família aceitou que o pai ficasse internado no hospital público Sousa Aguiar, para onde foi levado no dia da prisão (quarta, 16), mesmo tentando uma transferência para uma unidade particular. No entanto, disse que ela, o pai e a mãe, a prefeita de Campos dos Goytacazes Rosinha Garotinho (PR), ficaram indignados ao saber que o ex-governador precisaria ser transferido para uma unidade de pronto-atendimento dentro de Bangu. Segundo ela, o local não tinha estrutura para receber um paciente no estado de Garotinho, com problemas cardíacos.
“O que está sendo discutido aqui é ele ser retirado de um hospital público, onde ele estava sendo atendido numa unidade coronariana, como paciente cardíaco, para transferi-lo para uma unidade de pronto-atendimento que não tinha infraestrutura para um paciente coronariano”, disse Clarissa. “Então, naquele momento, nós familiares, realmente ficamos extremamente abalados. Não se vê nada tão brutal como o que fizeram com ele nem em ambientes de guerra”.
A deputada, que foi expulsa de seu antigo partido, PR, subiu o tom durante o discurso e afirmou que o pai não foi corretamente tratado pela Justiça.
“Não posso me calar e preciso encontrar forças para lutar contra essa arbitrariedade. Nós não podemos permitir a continuidade desse abuso de autoridade que está acontecendo no Brasil. O meu pai, o ex-governador Anthony Garotinho, talvez seja o caso mais emblemático do abuso de autoridade nos últimos tempos aqui no Brasil”, afirmou.
“Eu não poderia deixar de registrar essa arbitrariedade, essa ilegalidade, essa crueldade, essa desumanidade. O meu pai foi submetido a um cateterismo, ele colocou um stent. Esse estresse todo a que ele foi submetido… ele poderia ter infartado, ele poderia não estar mais aqui entre nós. E quem iria responder pela vida dele, senhor presidente, quem?”.
Após encerrar seu discurso, Clarissa Garotinho foi cumprimentada pelo presidente da sessão deliberativa, que perguntou se Anthony Garotinho estava recuperado. Neste momento, a deputada chorou e disse que o pai já estava em casa – ele foi transferido para prisão domiciliar nesta terça.
“Senhor presidente, o senhor não tem noção do que nós vivenciamos. Não podemos mais permitir no Brasil esse tipo de coisa”, disse ela, emocionada.
Garotinho é suspeito de integrar um esquema de compra de votos na eleição municipal de Campos dos Goytacazes, seu reduto eleitoral. Ele é secretário de Governo da cidade.