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Feministas francesas a Catherine Deneuve: “Os porcos e seus (suas) aliado(a)s têm razão de se inquietar”
Um grupo de feministas francesas publicou no jornal francês Le Monde uma resposta ao manifesto de cem atrizes, lideradas por Catherine Deneuve, que criticou o suposto “puritanismo sexual” do movimento #MeToo(#EuTambém) ou #balancetonporc (“denuncia teu porco”), que estimula mulheres a denunciar casos de assédio, em um texto divulgado no mesmo jornal. Como parte da campanha #MeToo, atrizes que participaram da cerimônia do Globo de Ouro 2018 foram vestidas de preto em protesto contra o machismo e o assédio sexual em Hollywood, entre elas Natalie Portman e Oprah Winfrey, que em suas falas públicas na cerimônia reforçaram a adesão ao movimento iniciado após as denúncias contra o produtor Harvey Weinstein.
“Os porcos e seus (suas) aliado(a)s têm razão de se inquietar
Cada vez que os direitos das mulheres progridem, que as consciências acordam, as resistências aparecem. Em geral, elas tomam a forma de um “é verdade, mas…”. Com diversas militantes feministas, respondemos à tribuna doLe Monde.
Este 9 de janeiro tivemos direito a um “#Metoo é legal, mas….”. Nada realmente novo nos argumentos utilizados. Encontramos os mesmos argumentos no texto publicado no Le Monde no trabalho, em torno da máquina de café ou em refeições familiares. Esta tribuna é um pouco o colega incômodo ou o tio cansativo que não entendem o que está acontecendo.
“Arriscaríamos ir muito longe”. Sempre que a igualdade avança, mesmo que meio milímetro, as boas almas imediatamente nos alertam para o fato de que arriscamos cair no excesso. No excesso, estamos totalmente dentro. É aquele do mundo em que vivemos. Na França, todos os dias, centenas de milhares de mulheres são vítimas de assédio. Dezenas de milhares de agressões sexuais. E centenas de violações. Todos os dias. A caricatura está aí.
“Não se pode mais dizer nada”. Como se o fato de nossa sociedade tolerar – um pouco – menos do que antes as propostas sexistas, assim como as propostas racistas ou homofóbicas, fosse um problema. “Nossa! Era francamente melhor quando podíamos chamar as mulheres de vagabundas tranquilamente, hein?”. Não. Era pior. A linguagem tem influência no comportamento humano: aceitar insultos contra as mulheres significa, na verdade, autorizar as violências. O controle de nossa língua é um sinal de que nossa sociedade está progredindo.
“É puritanismo”. Fazer com que as feministas pareçam travadas ou mesmo mal-amadas: a originalidade das signatárias da tribuna é… desconcertante. A violência pesa sobre as mulheres. Todas. Pesa sobre nossos espíritos, nossos corpos, nossos prazeres e nossas sexualidades. Como imaginar, só por um instante, uma sociedade liberada, na qual as mulheres disponham livremente e plenamente de seus corpos e de suas sexualidades, enquanto uma em cada duas declara já ter sofrido violência sexual?
“Não se pode mais paquerar”. As signatárias da tribuna misturam deliberadamente uma relação de sedução, baseada no respeito e no prazer, com uma violência. Misturar tudo é prático. Permite colocar tudo no mesmo saco. No fundo, se o assédio ou a agressão são “a paquera pesada”, é que não é tão grave. As signatárias se enganam. Não há uma diferença de grau entre a paquera e o assédio, mas uma diferença de natureza. As violências não são “sedução exagerada”. De um lado, considera-se a outra como igual, respeitando seus desejos, quaisquer que sejam. De outro, como um objeto à disposição, sem ligar para seus próprios desejos nem para seu consentimento.
“É responsabilidade das mulheres”. As signatárias falam sobre a educação a ser dada às meninas para que elas não se deixem intimidar. As mulheres são, portanto, designadas como responsáveis por não serem agredidas. Quando colocaremos a questão da responsabilidade dos homens de não estuprar ou agredir?
As mulheres são seres humanos. Como os outros. Temos direito ao respeito. Temos o direito fundamental de não sermos insultadas, assobiadas, agredidas, estupradas. Temos o direito fundamental de vivermos nossas vidas em segurança. Na França, nos Estados Unidos, no Senegal, na Tailândia ou no Brasil: este não é o caso hoje. Em nenhum lugar.
As signatárias são, em sua maior parte, reincidentes na defesa de pedófilos ou de apologias ao estupro. Elas usam, mais uma vez, sua visibilidade midiática para banalizar a violência sexual. Elas desprezam de fato as milhões de mulheres que sofrem ou sofreram essas violências.
Muitas delas estão, frequentemente, prontas a denunciar o sexismo quando vem de homens de bairros populares. Mas a mão na bunda, quando é exercida por homens de seu meio, tem a ver, segundo elas, com o “direito de importunar”. Essa estranha ambivalência permite apreciar seu apego ao feminismo que elas reivindicam.
Com este texto, elas tentam recolocar a camisa de força que começamos a retirar. Elas não conseguirão. Nós somos as vítimas de violência. Não temos vergonha. Estamos de pé. Fortes. Entusiastas. Determinadas. Vamos acabar com as violências sexistas e sexuais.
Os porcos e seus (suas) aliado(a)s estão preocupados? É normal. Seu velho mundo está desaparecendo. Muito devagar – devagar demais – mas inexoravelmente. Algumas reminiscências empoeiradas não mudarão nada nisso, mesmo publicadas no Le Monde.”
A polêmica carta de Catherine Deneuve e outras 99 francesas pelo ‘direito’ dos homens de cantarem as mulheres
A atriz francesa Catherine Deneuve, de 74 anos, veio a público para dizer que os homens deveriam ser “livres para flertar” com as mulheres.
Ela é uma das 100 mulheres francesas signatárias de uma carta aberta, publicada na terça-feira pelo jornal Le Monde, alertando para o que chamam de novo “puritanismo”, diante das recentes denúncias de assédio sexual na indústria do entretenimento.
“Nós defendemos a liberdade de importunar, indispensável à liberdade sexual”, diz o título da carta.
O manifesto lamenta a onda de “repreensões públicas” que vieram à tona após o escândalo envolvendo o produtor americano Harvey Weinstein, acusado de assédio sexual, e até estupro, por dezenas de mulheres.
O empresário nega as denúncias de sexo sem consentimento, mas admite que seu comportamento “causou muita dor”.
A publicação do artigo ocorre dois dias após a cerimônia do Globo de Ouro, em Los Angeles, em que diversas atrizes usaram vestidos pretos em protesto aos casos de assédio sexual. Na ocasião, a apresentadora Oprah Winfrey, uma das homenageadas da noite, fez um discurso contra o machismo e foi aplaudida de pé.
O que diz a carta?
A carta foi assinada por intelectuais, artistas e acadêmicas francesas, incluindo a escritora Catherine Millet e a cineasta Brigitte Sy. Elas afirmam que é legítimo e necessário protestar contra o abuso de poder por parte de alguns homens, mas dizem que as constantes denúncias perderam o controle.
“Os homens têm sido punidos sumariamente, forçados a sair de seus empregos, quando tudo o que eles fizeram foi tocar o joelho de alguém ou tentar roubar um beijo”, diz o texto.
“Estupro é crime, mas tentar seduzir alguém, mesmo de forma insistente ou desajeitada, não é – tampouco o cavalheirismo é uma agressão machista.”
As autoras argumentam que há um novo “puritanismo” no mundo.
“Essa febre de enviar “porcos” ao matadouro, longe de ajudar as mulheres a serem mais autônomas, serve realmente aos interesses dos inimigos da liberdade sexual, dos extremistas religiosos, dos piores reacionários”, diz o texto.
A referência ao animal remete à hashtag #Balancetonporc (“Denuncie seu porco”), versão francesa da campanha #MeToo (“Eu também”, em tradução literal), que encoraja as vítimas de assédio e abuso sexual a compartilhar suas histórias nas redes sociais.
“O #metoo resultou em uma campanha de denúncias públicas na imprensa e nas redes sociais de indivíduos que, sem terem a oportunidade de responder ou se defender, foram colocados exatamente no mesmo nível de agressores sexuais.”
Segundo elas, a onda de acusações induz à percepção de que as mulheres são impotentes e eternas vítimas.
“Como mulheres, não nos reconhecemos neste feminismo que, além de denunciar o abuso de poder, incentiva um ódio aos homens e à sexualidade.”