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Trump tenta apagar passado, mas a internet não esquece
São Paulo – A equipe responsável pela comunicação online do presidente dos Estados Unidos Donald Trump apagou do seu site de campanha diversos textos recentemente. Entre eles, havia um em especial: o que mencionava que o presidente proibiria a entrada de muçulmanos no país.
O assunto veio à toa novamente após uma pergunta feita em uma coletiva na Casa Branca, de acordo com o site da revista americana Wired . Na última semana, a Justiça questionou o advogado do Departamento de Justiça, Jeffrey Wall, sobre o caso. Ele argumentou que a restrição de entrada de pessoas nos Estados Unidos não discrimina as pessoas por religião. O juiz, Robert King, respondeu dizendo que Trump não repudiou o que disse no passado sobre os muçulmanos e ressaltou que o conteúdo a esse respeito ainda estava em seu site.
Diante desse cenário, um conteúdo em particular relacionado a banir muçulmanos sumiu do site eleitoral de Trump. Porém, a internet não se esquece de praticamente nada. Basta fazer uma pesquisa no Wayback Machine , uma ferramenta da organização sem fins lucrativos Internet Archive , que guarda dados publicados na internet, para encontrar o texto que fala sobre a restrição a muçulmanos.
Em casos como esse, o chamado Efeito Streisand costuma fazer com o que conteúdo censurado tenha efeito reverso e se torne de interesse do grande público.
Algo semelhante aconteceu em São Paulo. A equipe do prefeito da capital João Doria Jr. removeu conteúdos da gestão de Fernando Haddad do seu site.
Segundo o Estado de S. Paulo, ao menos três textos sobre a redução de velocidade das marginais Tietê e Pinheiros foram apagados do site da CET (Companhia de Engenharia de Tráfego). Neste caso, porém, os textos não foram armazenados pelo Internet Archive e já não podem mais ser acessados.
Eles eram chamados “Menor velocidade nas marginais e em vias da Zona Les te de São Paulo tem como objetivo reduzir índice de acidentes e mortes no trânsito”, “Acidentes com vítimas caem 27% nas marginais após redução da velocidade máxima” e “CET implanta redução de velocidade máxima em trecho da Marginal Tietê”. A administração se pronunciou dizendo apenas que as informações objetivas sobre os eventos no trânsito da c idade de São Paulo continuam disponíveis no site. Felizmente, os conteúdos podem ser lidos.
Marcos Troyjo: Eleição de Trump é “fim do mundo como o conhecemos”
Durante a corrida à Casa Branca, escancararam-se grandes diferenças no estilo de política externa dos EUA defendido pelos candidatos Hillary Clinton ou Donald Trump.
No limite, tais distinções remetem a dilema que frequenta a visão de mundo e a atuação externa dos EUA há pelo menos cem anos. Em grande parte de sua história, os EUA tiveram de optar por isolamento ou presença global.
No primeiro caso, amplamente observado no século 19, os norte-americanos forjaram sua política externa na compreensão de que seus vizinhos eram geopoliticamente fracos e de que a Europa era fonte dos males do mundo.
Cabia, portanto, fazer do Atlântico um “lago americano”, com forte poderio naval. Quanto a intervenções para além das Américas, como foi a Primeira Guerra Mundial, os EUA poderiam atuar para ajudar a restabelecer equilíbrios geopolíticos regionais, mas não “ficar no mundo”.
Foi justamente essa necessidade de permanecer nos palcos globais —como precondição da ideia de Ocidente depois da Segunda Guerra Mundial— a que Churchill convida os EUA em seu famoso pronunciamento no Westminster College, no Missouri há setenta anos. Esta foi a tônica do famoso discurso da “Cortina de Ferro”.
Nesta campanha presidencial, Hillary defendeu a permanência do engajamento global dos EUA em termos econômicos e militares. Se vencesse as eleições, ela continuaria a defender o “pivô para a Ásia” da política externa, iniciado na presidência Obama, e que rompeu com uma tradição de 200 anos de priorização dos temas atlânticos.
Como presidente, Hillary traria consigo a experiência de haver chefiado o Departamento de Estado e, portanto, fluência nas minúcias da diplomacia.
A propósito, Hillary teria como companheiros na lista de presidentes que também foram Secretários de Estado nomes como Thomas Jefferson, James Madison, Monroe, John Quincy Adams, Martin Van Buren e James Buchanan (este um dos piores presidentes, segundo muitos analistas, por não haver evitado a Guerra Civil). Os EUA, portanto, não veem um presidente que anteriormente tenha exercido o cargo de secretário de Estado desde em 1857, quando Buchanan começou seu mandato.
Hillary manteria a estratégia de combate ao Estado Islâmico (EI) e à Al Qaeda sem o comprometimento de tropas americanas. Privilegiaria, assim, a utilização ampliada de tecnologia (com drones de ataque, por exemplo) e apoio logístico e de inteligência a forças locais, como na atual ofensiva das forças iraquianas contra o EI em Mossul.
A candidata democrata também se oporia a uma expansão do poderio militar chinês e suas ambições territoriais, sobretudo marítimas, bem como ao regime de Putin na Rússia.
Se vencesse, com Hillary haveria ao menos a possibilidade de reedição de uma nova iniciativa para as Américas. Foi o que ela sinalizou no discurso reservado que pronunciou numa reunião corporativa do Banco Itaú em 2013 —e que vazou pela imprensa via WikiLeaks. Talvez ali estava a verdadeira Hillary— e não a personagem protecionista que ela encenou durante a campanha.
Já Trump representa um fator “desglobalizante” para a política externa dos EUA. Washington provavelmente se afastará de muitos dos pilares que sustentam a visão de mundo dos EUA há décadas. Aumentam os embaraços com OTAN, Banco Mundial, FMI e as demais chamadas “instituições de Washington”. Trump, se seguir a linha que indicou durante a campanha, denunciará o Nafta e rasgará o TTP, além de incitar a uma guerra comercial contra atuais parceiros como México ou China.
Outro fator notável será a abertura a uma maior cooperação com a Rússia de Putin, com quem Trump já trocou elogios públicos. Trata-se de uma enorme mudança em relação ao candidato republicano anterior – Mitt Romney – que durante a campanha de 2012 identificou no Kremlin o principal antagonista geopolítico dos interesses de Washington.
Trump se vale de parte da insatisfação econômica interna, como o sentimento de perda de postos de trabalho que a mão de obra industrial menos qualificada experimenta nos EUA, para disseminar soluções simplistas de política externa baseadas em preconceitos ou diagnósticos equivocados.
Deste bizarro acervo fazem parte proposições como banir a entrada de muçulmanos nos EUA, construir um muro na fronteira com o México, ou impor uma tarifa unilateral de comércio sobre exportações chinesas aos EUA no patamar de 40%.
Em relação à Ásia, com Trump os EUA tendem a retrair sua presença na região. Tal hipótese é ótima para a China, que gosta de se ver como geopoliticamente preponderante na Ásia, e ainda guarda grandes ressentimentos do Japão e sua belicosidade antes e durante a Segunda Guerra Mundial.
Com tal retração, aumenta consideravelmente o peso relativo da capacidade de dissuasão chinesa, e, portanto, diminui o leque de opções para potências intermediárias como Malásia, Filipinas e Taiwan, embora seja difícil pensar nesta última alinhando-se a Pequim, salvo no caso de incorporação de Taipei ao regime da China continental.
Já no que toca à Europa, Trump se identifica com movimentos nativistas ou isolacionistas. Assim foi com as forças que trabalharam em prol do “brexit” e pode-se dizer o mesmo em relação a esses grupamentos políticos que disputarão eleições na França e na Alemanha em 2017.
Os EUA sempre viram a existência da União Europeia e a Otan como algo central para seus interesses de estabilidade e segurança no Velho Continente. Isso continuaria com Hillary, que também buscaria avançar no TTIP —a Parceria Transatlântica de Comércio e Investimentos. Já com Trump, tanto o Tratado do Atlântico Norte como a burocracia de Bruxelas perdem relevância. Navegamos em águas desconhecidas.
Pouco deve-se esperar da Casa Branca em termos de América Latina. A região não é prioridade para Trump. O México tem maior relevância seja em função do Nafta ou da questão imigratória.
Tudo isso, no entanto, dependerá de quanto da tresloucada retórica da campanha ele carregará consigo para a Casa Branca. O mais correto é dizer que Trump não tem um plano de política externa, apenas um conjunto de posições superficiais.
Numa canção de 1987 da banda de rock R.E.M ouvia-se “It’s the End of the World as We Know It (And I Feel Fine)”.
A eleição de Trump certamente representa a sensação de “fim do mundo como o conhecemos”, mas com ela, ao redor do globo, poucos se sentem bem.
Por: Marcos Troyjo – Folha de São Paulo