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Movimentos de mulheres reprovam Campanha #AmorSemViolência

Mulher

Lideranças feministas e movimentos sociais que vivenciam e atuam diretamente no combate a violência contra à mulher em Petrolina e região pontuam falhas gritantes na campanha.

Veja a nota:

NOTA  PÚBLICA

Se tem violência, não é amor – carta de repúdio à campanha #AmorSemViolência

Feminismo e combate à violência de gênero não são expressões inventadas por modismo. Não é vitimismo! É um ato de sobrevivência das mulheres, para as mulheres, desde sempre, e não servem para atender caprichos políticos.

A campanha #AmorSemViolência, empreendida pelo Blog Carlos Britto se apresenta à sociedade petrolinense, sobretudo às mulheres, como uma aliada no combate à violência doméstica sofrida cotidianamente. Porém, esta comete erros absurdos, esdrúxulos e contraditórios que se configuram como um desserviço às ações de combate ao patriarcado, racismo e machismo que historicamente legitimam essa violência em nosso país.

A campanha nos faz constatar que foi forjada sem a participação dos movimentos sociais e das mulheres engajadas nesta luta. Nós, enquanto lideranças feministas, movimentos sociais e representantes da sociedade civil, que vivenciamos e atuamos diretamente no combate à violência contra mulher continuamente, pontuamos fatores controversos na campanha #AmorSemViolência, tais como:

  • A começar pelo título da campanha, “#AmorSemViolência”, completamente contraditório, pois não existe amor com violência; É simples: se há violência, NÃO É AMOR. Portanto, ao colocar esse título, a campanha romantiza relações abusivas, assim como há um tempo atrás, os feminicídios eram chamados de “crimes passionais”.
  • As mudanças sugeridas nas mensagens vinculadas pela campanha ficam a cargo apenas do fato de que as mulheres devem “ser fortes” e dizer “já deu”, pondo um fim na relação afetiva. Sendo perversa com as mulheres, a campanha reforça a cultura de “romantização da violência” e condena a vítima. Como diz Simone De Beauvoir: “Natureza feminina é um mito inventado pelos homens para prender as mulheres na condição de oprimida”.
  • A campanha apresenta superficialmente a violência física, tendo em vista que não são abordados e/ou informado a existência de outros tipos de violência, como: violência moral, sexual, patrimonial e psicológica, sofrida pelas mulheres, que compõe as amarras que muitas vezes impedem que estas saiam da situação de violência. Essas mulheres não estão presas a essas violências porque querem, e colocar que dizer “já deu” é a solução para anos de opressão e violência de nossos corpos é, no mínimo, não conhecer o básico do debate de gênero;
  • Ignora-se o agressor, restando à própria vítima assumir a culpa pela agressão, só havendo estímulo à denúncia 180, desconsiderando outros mecanismos de apoio à vítima como Delegacia da Mulher, CRAM, CIAM, CREAS, Conselho da Mulher, entre outros. Bem como os recursos possíveis para auxiliá-la a sair da situação de violência, como medidas protetivas e sistema de abrigamento;
  • A invisibilidade da mulher negra mais uma vez é constatada. Embora as estatísticas apontem que 59,4% dos registros da central de atendimentos a violência – disque 180, são de mulheres negras, e que houve um aumento de 54,2% dos homicídios para as mulheres negras em comparação às brancas (ONU Mulher e SPM/2015), tais dados ou relevância destes são totalmente ignorados nesta campanha;
  • Não é apontado o feminicídio (assassinato de mulheres, por sua condição de mulher, esposa, companheira), e como sua recorrência – baseada na objetificação das mulheres, tratadas como posse dos agressores – tem causado vítimas cotidianamente, com dados extremamente preocupantes no Vale do São Francisco. A campanha, seguindo o caminho midiático, negligencia o uso do termo e a violência extrema em si, caminho contrário aos esforços de grupos organizados no enfrentamento à violência, e na conquista dessa caracterização de homicídio como crime hediondo.

Dados alarmantes são informados e o objetivo da campanha até parece se afinar a uma necessidade real, a busca por “chamar a atenção da sociedade e mobilizar as pessoas pelo fim da violência contra a mulher, além de estimular as denúncias”. No entanto, culpabiliza-se às mulheres por se encontrarem na situação de violência, e por não reagir.

Fato mais lamentável ainda é o de que toda essa perspectiva machista e racista que soberbamente – e sordidamente – se impõe como uma campanha que vem proteger as mulheres delas mesmas é realizada em parceria e com o aval da Prefeitura Municipal e a Secretaria da Mulher, órgãos públicos que deveriam ter um mínimo de conhecimento sobre a violência simbólica velada no discurso do crime passional e estar em afinidade com as políticas públicas voltadas para mulheres que condenam todas as falhas apresentadas pela campanha. É inadmissível que tais órgãos corroborem com tal campanha tendo em vista todas as falhas já apontadas. Enquanto vias de intervenção que devem pensar na melhor forma de amparar os civis de acordo com suas particularidades, os mesmos se mostram complemente alheios ao debate qualificado sobre as realidades das mulheres.

Exigimos um pronunciamento da Prefeitura de Petrolina e da Secretaria da Mulher, além de uma autocrítica por parte do Blog Carlos Britto, para se pensar uma nova campanha, realizada com a atenção e a importância que merece o debate da violência contra a mulher, contando com a participação de profissionais, órgãos da administração pública, acadêmicos, movimentos sociais e sociedade civil na perspectiva de uma real mudança da realidade local no tocante ao tema.

Rede de Mulheres Negras em Petrolina

Coletivo Feminista Classista Ana Montenegro

Tatiana Carvalho – Psicóloga/militante feminista

Camila Roseno – Profª de História/militante feminista

GEIG- Grupo de estudos interdisciplinares em gênero

Márcia Alves – Sócia da Associação das Mulheres Rendeiras do bairro José e Maria

Associação das Mulheres Rendeiras

Gizelia Celiane – Professora da Rede Estadual de Educação da Bahia

Danielle Lisboa – Feminista/profº de História/ educadora social de proteção às mulheres vítimas de violência

Dalila Santos – Jornalista/ mestra e doutoranda em estudos de gêneros/ docente da UNEB/ Militante da Marcha Mundial das Mulheres

Cristiane Crispim – Atriz e produtora teatral/feminista/ Assessora no Mandato Coletivo –  profº Gilmar Santos

Ângela Santana – Radialista/ Feminista/ Chefe de Gabinete no Mandato Coletivo – profº Gilmar Santos

Ananda Fonseca, estudante de Psicologia/ militante feminista.

Núcleo Biruta de Teatro

Marcha Mundial das Mulheres

Cristina Costa – Vereadora

Coordenação de Mulheres do PT