Arquivos diários: 30 de outubro de 2023
HEGEL MATERIALISTA, MARX IDEALISTA: RUMO À RAZÃO DIALÉTICA
Há que analisar melhor a relação entre o idealismo de Hegel e o materialismo de Marx. Em Hegel não há dedução transcendental das ideias, mas um sistema teórico complexo que articula, em todos os desdobramentos, a relação entre categoria e experiência. A crítica de Marx, nesse contexto, não se destina a revelar o misticismo da ideia enquanto demiurgo da realidade. A coisa, para citar Rimbaud, passa por outro lugar.
A crítica de Marx, na verdade, engaja-se em outro entroncamento. Ainda que, em certas passagens acerbas, tenha criticado a ideia de que não basta a alteração da consciência ou a entronização de uma nova interpretação do mundo, não se pode negar que toda transformação real passa, inexoravelmente, pela constituição de uma interpretação nova da realidade. Por isso, a inserção do idealismo em Marx, idealismo hegeliano, que nunca ignora a efetividade, é salutar para o desenvolvimento mais cabal do marxista. Numa carta a Schelling, em que expressa de forma profunda o sentido kantiano do dever ser, revela que, na medida em que os intelectuais indiquem como as coisas devem ser, as massas, ao serem mobilizadas pela força das ideias, podem sair da letargia e assumir formas organizativas transformadoras. Não seria tal idealismo essencial para nos libertar de certo fatalismo teoricista que, ignorando as complexidades reais, propõem, no vazio, que a realidade, forçosamente, espelhe o programa prévio? Nesse sentido, a continuação do marxismo autêntico deve ter por missão conferir mais determinações concretas ao pensamento de Hegel e atribuir mais idealismo ao materialismo dialético de Marx, especialmente, para que o dever ser seja não uma ideia reguladora no sentido kantiano, mas, no sentido de Nietzsche, uma experiência pragmática e extremamente aberta. Walt Whitman: canção da estrada aberta. Pragmatismo e movimento. Parafraseando o velho Mao Tsé-Tung: não seria o erro, na medida em que for assimilado, uma condição para a produção da verdade?
Por: Luís Eduardo Gomes do Nascimento, Advogado, Professor do Departamento de Ciência e Tecnologia, Campus |||, Juazeiro, Bahia, UNEB.